sexta-feira, 26 de fevereiro de 2010

UM CONTO PAULISTANO



                         Era um dia como outro qualquer.  Caminhei até a estação São Bento, subi até a rua do mesmo nome; segui e então já havia chegado na Praça do Patriarca, com sua gigantesca e incoerente cobertura metálica recentemente construída no quadrilátero , e de tão incoerente que é, a própria estátua do homenageado dá as costas como que dotada de sentimento.  Logo chegando ao Viaduto do Chá, embalado pelo repente que ressoava do vale, de repente fitei o prédio do Shopping Light, que outrora fora a sede da Eletropaulo; olhei o prédio que há alguns anos fora o badalado Mappin, depois Extra-Mappin e hoje, curiosamente, servia de concha acústica para um cantor-pastor anônimo, que nas portas do prédio, entoava cantos eivados de emoção e louvor . Vi  pessoas indo, vindo, atravessando, vendendo, comprando, lendo sorte sob tendas multicores ou simples guarda-sóis puídos, enfim pessoas buscando, cada uma bem sabe o que, ou então buscando o que não sabem, prédios, pessoas,   carros e sons, tudo mudando; nada é permanente.   Apenas o Municipal, pioneiro teatro que neste espaço da cidade, fitava imóvel tudo ao seu redor mudar, desde as pessoas que passam, até o nome de seus vizinhos, e neste instante éramos dois a pensar o que seria daqui a pouco.  
Então   voltei , segui até a Catedral da Sé, e de sua escadaria, após fitar por minutos a fio a pulsação árida de uma tarde de um dia qualquer, recitei  mentalmente um misto de prece com frase pop   - refrão de música bairrista:      "São Paulo, sua alma de pedra não vive de sangue; São Paulo, seu grito não serve neste surdo espanque punk....   Você precisa parar..."
    Vi, ouvi, senti a pulsação de São Paulo nas pessoas, entendi que tudo forma um imenso organismo que a propósito necessita há muito de quem dele cuide; senti que sou tudo e tudo é eu.......        Como um ser gigantesco a me desafiar os sentidos, o movimento que se desenvolvia freneticamente tentava fazer com que me sentisse culpado por estar assim - observando e não integrando a massa que mais parecia inconsciente que dotada de vontade; senti que era puxado pelo conjunto, seduzido pelo pudor, e então percebi que podia fazer minha escolha - havia vencido assim, a ilusão de ser comum, ainda que não fosse diferente de ninguém.
       Era um dia como um dia qualquer, em um ano qualquer, e eu, uma pessoa como outra qualquer neste dia, e a partir deste dia, nunca mais acordei da mesma forma, nunca mais me comportei da mesma forma; hoje sinto que tudo é interdependente, impermanente, e mais que tudo, uma única coisa - a Vida.
    Neste dia, passei a ter uma nova visão de vida.

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